terça-feira, 16 de novembro de 2010

Feliz Aniversário!

Hoje Saramago faz 88 anos. Uso o presente intencionalmente: homens assim não morrem.
O aniversário é do Saramago, a prenda recebia eu.
A Ana Luísa trouxe-me, precisamente hoje, um texto que escreveu inspirada pelo do Saramago "O Sorriso". Ela consentirá que partilhe esta prenda convosco.



     O sorriso não tem descrição única, não tem situação marcada, nem até uma emoção determinada.  O seu simples acto lança variadas manifestações, assim como o chafariz lança cada gota de água.
     O sorriso varia com as pessoas, as experiências e os sentimentos. Mas todas as pessoas já foram merecedoras de sorrisos e já sorriram, espontaneamente. O sorriso transmite paz, simpatia, alegria, veracidade e, até, ousadia. Acalma o coração da gente e dos animais. Até eles percebem o que um sorriso transmite. O sorriso serve de "sim" e uma pergunta inesperada, num dia, num jardim, entre duas pessoas enamoradas. Ela sorri e segue-se um outro sorriso da parte dele, como uma nascente enchendo-se de novo, sem parar de fluir neles.
     Um verdadeiro sorriso, que seja simples e sereno, contém uma empatia e uma emoção tão puros que nem um riso melódico pode superar, ou até mesmo o olhar de uma ninfa. A simplicidade é o segredo, é esse o valor que tem. Sem sorrir, as emoções não são extravasadas para o mundo cá fora, há dureza, rostos sem expressão, palavras por dizer e sorrisos que os completam.
     Acredito que o sorriso seja a verdadeira luz da emoção.


Ana Luísa, 10º A






O texto de Saramago, que inspirou o da Luísa, é este:


O Sorriso - José Saramago
Sorriso, diz-me aqui o dicionário, é o acto de sorrir. E sorrir é rir sem fazer ruído e executando contracção muscular da boca e dos olhos.
O sorriso, meus amigos, é muito mais do que estas pobres definições, e eu pasmo ao imaginar o autor do dicionário no acto de escrever o seu verbete, assim a frio, como se nunca tivesse sorrido na vida. Por aqui se vê até que ponto o que as pessoas fazem pode diferir do que dizem. Caio em completo devaneio e ponho-me a sonhar um dicionário que desse precisamente, exactamente, o sentido das palavras e transformasse em fio-de-prumo a rede em que, na prática de todos os dias, elas nos envolvem.
Não há dois sorrisos iguais. Temos o sorriso de troça, o sorriso superior e o seu contrário humilde, o de ternura, o de cepticismo, o amargo e o irónico, o sorriso de esperança, o de condescendência, o deslumbrado, o de embaraço, e (por que não?) o de quem morre. E há muitos mais. Mas nenhum deles é o Sorriso.
O Sorriso (este, com maiúsculas) vem sempre de longe. É a manifestação de uma sabedoria profunda, não tem nada que ver com as contracções musculares e não cabe numa definição de dicionário. Principia por um leve mover de rosto, às vezes hesitante, por um frémito interior que nasce nas mais secretas camadas do ser. Se move músculos é porque não tem outra maneira de exprimir-se. Mas não terá? Não conhecemos nós sorrisos que são rápidos clarões, como esse brilho súbito e inexplicável que soltam os peixes nas águas fundas? Quando a luz do sol passa sobre os campos ao sabor do vento e da nuvem, que foi que na terra se moveu? E contudo era um sorriso.




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